Por que gostamos de sentir medo?

Desde tempos imemoriais, o ser humano tem se deixado enredar pelo temor. Sentimo-nos irresistivelmente atraídos por aquilo que nos provoca calafrios, acelera os batimentos cardíacos e nos faz prender a respiração. E, paradoxalmente, buscamos esse sentimento de forma voluntária: assistimos a filmes de terror, exploramos histórias sombrias e percorremos corredores imaginários onde sombras parecem ganhar vida. Mas por que gostamos de sentir medo? A ciência por trás do horror revela uma complexa dança entre cérebro, emoção e prazer.

O cérebro em alerta: o papel da amígdala

Quando nos deparamos com uma situação ameaçadora, seja real ou ficcional, uma pequena estrutura cerebral chamada amígdala entra em ação. Localizada profundamente dentro do lobo temporal, a amígdala é responsável por identificar perigos e acionar respostas automáticas de sobrevivência. Seu coração acelera, a respiração se torna mais rápida, a atenção se afina. É o instinto de sobrevivência, preservado por milhões de anos de evolução.

Nos filmes de terror, nosso cérebro reage de forma semelhante à realidade, mesmo sabendo que estamos seguros no sofá de casa. Halloween (1978), por exemplo, nos faz sentir cada passo de Michael Myers como uma ameaça iminente, provocando uma resposta fisiológica de alerta que nos faz tremer, engolir seco e prender o fôlego.

Halloween 1978
Halloween (1978)

Adrenalina e dopamina: prazer no medo

O medo provoca a liberação de adrenalina, que prepara o corpo para lutar ou fugir. Mas, no contexto controlado de um filme, essa descarga de energia se transforma em prazer. O cérebro, ao perceber que não há perigo real, libera dopamina, o neurotransmissor do prazer. Essa combinação de alerta e recompensa cria uma experiência intensa e viciante.

Filmes como Hereditário (2018) exploram essa dualidade: cenas cuidadosamente construídas geram picos de tensão, e, quando a ameaça não se concretiza de maneira fatal, sentimos um prazer peculiar — a sensação de que enfrentamos o perigo sem sermos atingidos.


Jumpscares e suspense: engenharia do terror

O cinema moderno domina a arte de manipular o medo. Um jumpscare inesperado provoca uma reação quase reflexiva: sobressalto, grito, coração disparado. Mas nem todo susto é eficiente; a ciência mostra que o suspense gradual, construído com som, iluminação e narrativa, ativa regiões cerebrais ligadas à antecipação e ao prazer, mais intensamente que sustos repentinos.

Invocação do Mal (2013) exemplifica a excelência do suspense. A tensão aumenta silenciosamente antes de um evento chocante, fazendo com que o público sinta o medo de maneira prolongada, quase ritualística.

Psicologia do horror: catarse e curiosidade

Além da neuroquímica, existe uma dimensão psicológica. Sentir medo em segurança proporciona uma espécie de catarse — a purgação de emoções intensas sem risco real. Assistir a O Chamado (2002) ou A Bruxa (2015) permite confrontar medos arquetípicos: escuridão, morte, entidades desconhecidas — tudo em um ambiente controlado, onde podemos processar nossas emoções sem perigo.

A curiosidade também desempenha papel crucial. Queremos saber “o que acontecerá”, mesmo que isso nos cause ansiedade. A mente humana é programada para buscar padrões e soluções; o terror oferece enigmas, mistérios e finais inesperados que estimulam nosso raciocínio emocional.


Diferença entre medo real e medo ficcional

O cérebro humano distingue, mesmo que sutilmente, entre ameaça real e ficcional. Embora o corpo reaja de forma semelhante — sudorese, aceleração cardíaca, respiração ofegante —, a consciência de que estamos seguros transforma a experiência. Essa dualidade é fascinante: podemos sentir medo intenso sem risco, e ainda assim extrair prazer disso.

It: A Coisa (2017) explora esse contraste magistralmente. Bill Skarsgård, como Pennywise, evoca o terror visceral de uma criança que enfrenta monstros invisíveis, enquanto os espectadores experimentam medo sem estarem em perigo real.

It: A Coisa

Por que algumas pessoas amam e outras odeiam o terror

A reação ao terror não é universal. Estudos de personalidade indicam que indivíduos com maior abertura à experiência e tolerância à excitação tendem a buscar filmes de horror com prazer. Já pessoas mais ansiosas ou com baixa tolerância ao estresse físico podem sentir repulsa ou ansiedade intensa. É uma mistura de biologia, experiências passadas e predisposição genética.

Filmes como Atividade Paranormal (2007) podem gerar fascínio em alguns e repulsa em outros, dependendo da sensibilidade emocional e da predisposição ao medo controlado.


O fascínio pelo desconhecido

Parte do apelo do terror reside no mistério. O que não vemos ou não entendemos provoca inquietação. O desconhecido ativa áreas cerebrais associadas à vigilância e à curiosidade. Por isso, clássicos do terror psicológico, como O Sexto Sentido (1999), permanecem tão cativantes décadas depois: eles jogam com a imaginação do espectador, criando experiências de medo profundas sem depender de violência explícita.

Conclusão: o prazer no abismo

Sentir medo é uma experiência complexa, que combina biologia, psicologia e narrativa. Filmes de terror nos permitem explorar o abismo de nossa própria mente, confrontar medos antigos e modernos, e experimentar prazer em contextos seguros. É um reflexo de nossa natureza curiosa, vulnerável e, paradoxalmente, destemida.

Portanto, da próxima vez que você se encolher no sofá, sentindo o coração disparar diante de uma sombra ou de um grito repentino, lembre-se: você está vivenciando uma dança antiga entre o perigo percebido e o prazer secreto. E é exatamente isso que torna o terror irresistível.

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